segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Não me chames estrangeiro




Não me chames estrangeiro
Rafael Amor


Não me chames estrangeiro
só porque nasci muito longe
ou porque tem outro nome essa terra de onde venho.

Não me chames estrangeiro
porque foi outro o meu seio
ou porque ouvi, na infância, outros contos noutras línguas.

Não me chames estrangeiro
se, no canto e no beijo de uma mãe,
tivemos a mesma luz e o mesmo amor
com que elas nos sonham iguais quando nos têm contra seu peito.

Não me chames estrangeiro
nem perguntes donde venho;
é melhor saber para onde vamos,
para onde o tempo nos leva.

Não me chames estrangeiro
porque o teu alimento e o teu calor
acalmam minha fome e meu frio e o teu teto me convida.

Não me chames estrangeiro!
Teu trigo é como o meu trigo,
o teu fogo é como o meu fogo, tua mão é como a minha
e a fome nunca avisa: vive a mudar de dono.

E me chamas estrangeiro
porque outro caminho me trouxe,
porque nasci noutra terra, porque conheço outros mares
e parti, um dia, de outro porto...

Mas são sempre, sempre iguais os lenços da despedida,
iguais as pupilas sem brilho dos que deixamos distantes,
iguais os amigos que nos chamam
e também iguais o afeto e o amor
de quem sonha com o dia do regresso.

Não me chames estrangeiro!
Trazemos o mesmo grito,
o mesmo e velho cansaço
que sempre arrastou o homem
desde os remotos tempos sem fronteiras,
quando ainda não havia os que hoje dividem e matam,
os que roubam, os que mentem,
os que vendem nossos sonhos
e os que inventaram, um dia, a palavra: estrangeiro.

Não me chames estrangeiro!
É uma palavra triste, gelada,
e que tem cheiro de esquecimento, de exílio...

Não me chames estrangeiro!
Olha o teu filho e o meu
como correm de mãos dadas até ao fim do caminho.
Eles não conhecem línguas,
nem limites, nem bandeiras
e seus risos, como pombas, os fazem voar aos céus, em grupos.

Não me chames estrangeiro!
Vê teu irmão e o meu,
com o corpo crivado de balas, beijando o solo de morte.
Não eram estrangeiros e conheciam-se desde sempre,
pela eterna busca da liberdade...
E, livres, os dois morreram.

Não me chames estrangeiro!
Olha-me nos olhos
além do ódio, do egoísmo e do medo,
e verás que sou igual a ti... Humano!

Não posso ser estrangeiro!

( Texto traduzido por Simone Czeresnia e adaptado por Cleide Canton)
Pela Consciência Universal

Colaboração Mirna Lanius Borella Bravo - RS

Nenhum comentário: