segunda-feira, 1 de abril de 2013

Crise arruína pequenas empresas italianas


The New York Times GUIDONIA, Itália - Emanuele Tedeschi limpou a serragem das mãos e fez um gesto mostrando a ampla marcenaria que está há duas gerações com sua família.
As grandes máquinas, que costumavam fazer hora extra entalhando móveis sob encomenda até para o Vaticano, agora ficam ociosas, numa oficina quase sem trabalhadores. 

"Há um ano e meio, o barulho da produção era tão alto que você precisava gritar para ser ouvido", disse Tedeschi. 

Desde que o governo implantou um plano de austeridade para blindar a Itália da crise da dívida europeia, a economia despencou em uma das piores recessões entre todos os países da zona do euro. Como resultado, as encomendas para a marcenaria de Tedeschi, chamada Temeca, praticamente pararam. 

Cerca de mil empresas italianas (de um total estimado em 6 milhões) fecham as portas por dia na Itália -principalmente companhias pequenas e médias, a espinha dorsal da economia nacional, de US$ 2 trilhões por ano. 

A situação ganhou contornos urgentes depois das inconclusivas eleições italianas de fevereiro deste ano. "Sem ninguém governando o país, haverá mais paralisia, então as coisas vão piorar", disse Tedeschi, 49.
Um novo governo provisório, que pode ser instalado em algumas semanas, dificilmente terá força para aprovar reformas, aprofundando os problemas da Itália e da Europa. 


Gianni Cipriano/International Herald Tribune 
A marcenaria Temeca, em Guidonia, na Itália, teve uma dramática redução nas suas encomendas no último ano e meio
A marcenaria Temeca, em Guidonia, na Itália, teve uma dramática redução nas suas encomendas no último ano e meio  

"Isso aumenta a possibilidade de a Itália ter uma década como a do Japão, com crescimento fenomenalmente lento", disse Kenneth Rogoff, professor da Universidade Harvard e ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional. "Isso motiva perguntas dolorosas sobre a estabilidade do crescimento da zona do euro como um todo a longo prazo." 

Os males da economia italiana, uma das maiores da Europa, não são necessariamente novos, é claro: burocracia pesada, leis trabalhistas sufocantes e excessiva dependência em relação a empresas de pequeno porte, que sofrem para competir no mercado global. 

Mas os problemas agravaram-se no último ano, à medida que aumentos tributários e cortes de gastos foram impostos por Mario Monti, que assumiu como premiê em novembro de 2011, depois que a crise do euro levou à queda de Silvio Berlusconi. No ano passado, a economia encolheu 2,4%.

Metade das pequenas empresas é incapaz de pagar os salários em dia, segundo o instituto de pesquisas CGIA di Mestre. O desemprego subiu para 11,7% em janeiro, atingindo 38,7% entre os jovens. 

O programa de austeridade se destinava a reduzir o risco de uma crise da dívida e assegurar o apoio do Banco Central Europeu, mas, em vez disso, deixou o país sem crescimento. Sem crescimento, a Itália terá mais dificuldades para pagar sua dívida de US$ 2,6 trilhões -um dos maiores endividamentos da zona do euro.

Sob certos aspectos, a Itália não está tão capenga quanto outros países do euro. O governo italiano conseguiu reduzir o deficit público. Companhias como Ferrari, Benetton e Ducati continuam ajudando a Itália a manter a segunda maior base industrial da zona do euro, só atrás da Alemanha.

Mas são empresas como a de Tedeschi que estão quebrando devido à falta de crédito bancário e à elevação dos impostos. A concessão de empréstimos pelos bancos italianos caiu em 2012 ao menor nível em mais de uma década. O governo deve estimados € 70 bilhões a empresas italianas pelo fornecimento de serviços e produtos.

Recentemente, Tedeschi tomou uma decisão que esperava nunca tomar: demitir empregados, inclusive um marceneiro com mais de 30 anos de casa.

"Quando precisei demitir essa gente, chorei", disse ele no seu escritório, sob o olhar da mulher, Annarita Neroni, e do filho, Lorenzo. Tedeschi contou que vários membros da associação empresarial local se suicidaram no último ano.

A mulher de Tedeschi disse que a família parou de retirar salários há mais de um ano, para poder continuar pagando os funcionários restantes.

"O que está acontecendo é humilhante", disse Tedeschi. "Se eu falir ou empresas como a minha falirem, aí todo o resto vai à falência." Neroni pôs a mão sobre o ombro do marido. "Estamos passando por uma guerra financeira, que está nos enterrando", disse ela. "Haverá sobreviventes?" 

http://www1.folha.uol.com.br

Nenhum comentário: