Palazzo Venezia, aquele localizado na praça homônima, no centro de Roma, foi palco de uma das páginas mais conturbadas da história italiana. De uma de suas janelas Mussolini pronunciava discursos e incitava multidões. Hoje o edifício é sede de um importante museu, mas a maioria dos romanos visita o lugar movida pela curiosidade de saber o que há por trás daquela sacada.
Todo turista que tenha circulado pelo centro histórico de Roma provavelmente passou pela Piazza Venezia e diante do palácio homônimo que domina a praça, aquele de tons de ocre e aparência austera nos arredores do Altare della Patria e da Via del Corso.
Para os romanos, o Palazzo Venezia sempre foi um ponto de encontro. “Nos vemos debaixo da sacada”, costumam dizer ao combinar um programa qualquer, deixando subentendido que “a sacada” é aquela do Palazzo Venezia.
O que nem todos os estrangeiros sabem é que a janela daquela sacada possui um significado histórico conturbado que gera sentimentos contraditórios nos italianos. A maior parte daqueles que visitam o Palazzo Venezia são movidos não tanto pelo amor à arte, mas pela curiosidade de saber o que há por trás de sua famosa janela. Ninguém resiste a espiar como é Roma vista de lá do alto.
O edifício foi construído antes da descoberta do Brasil, a partir de 1465, por um cardeal que mais tarde foi eleito Papa: Paolo II Bardo. Um de seus ambientes é chamado de “sala dos papagaios” porque ali o pontífice criava pássaros exóticos.
Um fato interessante é que como em Roma quase tudo era reciclado, acredita-se que em sua construção foi utilizado o mármore proveniente do Coliseu e do Teatro di Marcello.
O pontífice era descendente de uma família veneziana e no interior do palácio você notará o brasão papal decorado com um leão, símbolo de Veneza. Daí deriva o nome desse importante edifício. Depois de residência papal, o palácio funcionou como embaixada da antiga República de Veneza (daí o seu nome) e também como sede diplomática austríaca.
A partir de 1916 o Palazzo Venezia passou a ser uma propriedade do estado italiano e durante os anos do fascismo Mussolini o transformou em seu escritório. Ele trabalhava na chamada Sala del Mappamondo. Quem viveu naquela época em Roma costuma contar que as luzes do edifício ficavam sempre acesas para demonstrar que o ditador trabalhava incessantemente e que a sua suposta virilidade fosse reforçada publicamente pela entrada e saída de damas no palácio.
Da sacada do Palazzo Venezia Mussolini incitava multidões, aguardava aplausos e exaltava a pátria. Foi de lá que ele declarou guerra à França e ao Reino Unido, anunciando que a Itália participaria da Segunda Guerra Mundial. Foram anos de delírio coletivo. Com as chamadas “leggi fascistissime” os partidos de oposição foram suspensos, a imprensa censurada e a escola tornou-se um dos principais canais para doutrinar as novas gerações sobre o regime totalitário.
Quem assistiu uma das obras-primas de Ettore Scola, o filme “Um dia muito especial”deve lembrar que em 1938 as casas de Roma permaneceram praticamente vazias porque todos os cidadãos foram convidados a festejar a visita de Hitler a Mussolini. No filme, em um prédio da periferia da capital só uma dona de casa (Sophia Loren) e o seu vizinho homossexual (Marcello Mastroianni) ficaram em seus apartamentos.
Há mais de um século o palácio é sede de um museu. Inicialmente o espaço reunia obras de arte medieval e renascentista, hoje é dedicado principalmente a artes aplicadas. Ali você encontra pinturas, esculturas em madeira e em bronze, bustos, porcelanas, crucifixos, peças de prata, uma coleção de armas. Um dos quadros mais famosos é aquele de Cleópatra realizado por Carlo Maratta. A peculiaridade da obra que retrata a rainha amada por Júlio César e Marco Antônio é que na pintura ela é loira e não com os cabelos escuros, como sempre foi reconhecida.
Quando visitar Palazzo Venezia olhe para cima e não deixe de admirar os afrescos do teto, como aquele do pintor toscano Giorgio Vasari. Parece incrível mas antes os afrescos de 1553 encontravam-se em outro importante edifício romano, o palácio de um banqueiro de Florença (Altoviti) que acabou sendo demolido. Em 1929 foram transferidos até o Palazzo Venezia e os afrescos homenageiam a terra natal da família de banqueiros (Florença), a cidade onde trabalhavam (Roma), a deusa da abundância e da agricultura (Cerere) e Michelangelo Buonarotti.
O Museo Nazionale del Palazzo Venezia também inclui ambientes externos como oLapidarium, pórticos repletos de objetos como sarcófagos e capitólios e uma vista incrível do Altare della Patria e um pátio com um jardim decorado com uma fonte barroca.
Hoje a famosa janela da sacada do Palazzo Venezia permanece fechada e protegida por um cadeado; uma maneira real e simbólica de evitar que alguém possa cair na tentação de reviver essa página do passado.
Museo Nazionale del Palazzo Venezia: Via del Plebiscito, 118. Aberto de terça a domingo das 8h30 às 19h30. Ingressos: 5 euros. Gratuito nos primeiros domingos do mês.
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