A professora Maria Emmi, autora de um trabalho de fôlego e profundidade sobre a presença dos imigrantes italianos na Amazônia. Foto: Divulgação
Em 1920, os italianos representavam o terceiro maior grupo de imigrantes na Amazônia, atrás apenas dos portugueses e espanhóis. Mas nas literaturas não constam esses dados; em algumas delas apenas é mencionado que a imigração italiana nessa região foi passageira e mal sucedida. Será? Para tentar preencher esse vazio de informações e entender melhor esse processo migratório e suas influências na cultura e na economia amazônicas, a socióloga Marília Ferreira Emmi, do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA, dedicou sua tese de doutorado sobre o assunto.
Com base em documentos manuscritos da época de 1899 do Arquivo Público do Pará, arquivos do Vice-Consulado da Itália no Pará, relatos de viajantes e entrevistas com descendentes de italianos, foi possível reconstituir a composição familiar e suas trajetórias. Embora boa parte das famílias italianas tenha vindo diretamente para as cidades amazônicas, outras passaram por cidades do Centro-Sul (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte) e do Nordeste (Recife, Salvador) antes de se fixarem na Amazônia. Houve ainda quem passasse por países da América Latina, como a Venezuela. No entanto, quando se analisa um processo imigratório também é preciso avaliar a emigração, que, no caso dos italianos vindos no final do século XIX, se deu por etapas: primeiro vinham os homens, chefes de família ou solteiros. Depois de se estabelecerem, mandavam buscar suas esposas e filhos ou ainda voltavam à Itália para casar.
Em sua pesquisa, Profa. Emmi considera os religiosos, arquitetos, músicos e outros artistas que vieram para a Amazônia um segmento importante, mas foca seus estudos nas famílias que criaram raízes por aqui, se incorporando à sociedade local. Assim, foram classificados dois grupos de imigrantes italianos: os que foram para as áreas rurais e os que foram para as cidades. Ambos se diferenciam pelas regiões de origem e de destino, pelos motivos da imigração e pela composição familiar.
O primeiro grupo era formado por famílias de agricultores originários das regiões do Vêneto, Campânia e Sicília, que subsidiados pelo Governo do Pará vieram povoar as colônias agrícolas Ianetama, Anita Garibaldi, localizadas ao longo da estrada de ferro Belém-Bragança e a colônia de Outeiro, localizada na ilha do mesmo nome. Mas essa foi uma imigração que não teve continuidade nem na chegada dos imigrantes, nem na permanência dos mesmos nas áreas de destino. Com a desativação das colônias em 1902, no governo de Augusto Montenegro, muitas famílias abandonaram seus lotes e se espalharam pelos municípios vizinhos.
Por outro lado, o segundo grupo veio espontaneamente para os centros urbanos. Era formado por pequenos proprietários e artesãos originários da Calábria, Basilicata e Campânia, que com recursos próprios emigraram e se instalaram em Belém e Manaus e em municípios do Baixo Amazonas como Óbidos, Santarém, Oriximiná, Juruti, Faro, Terra Santa e Alenquer. Segundo a Profa. Emmi, em termos regionais esse segmento era mais numeroso e teve maior continuidade. Eles se firmaram, sobretudo, como comerciantes ou exerceram atividades tipicamente urbanas que exigia menor qualificação profissional como engraxates, sapateiros, jornaleiros, etc.
Influências culturais
A pesquisa tem uma relação com os nomes de mais de 100 famílias que vieram para a Amazônia até 1920, cujos descendentes ainda são encontrados em Belém, Manaus e em outras cidades do interior da Amazônia. "Observei grande interesse por parte dos entrevistados no resgate e registro das histórias de suas famílias, inclusive disponibilizando fotografias e documentos e até mesmo enviando por meio eletrônico, dados complementares aos documentos", revela Profa. Emmi mostrando a lista das famílias.
Segundo a Profa. Emmi, a presença italiana é marcante nas artes e na arquitetura. Além disso, hábitos de poupança e de operosidade concorreram para o êxito dos imigrantes e para sua integração. Aliado a isso, novos hábitos foram introduzidos, inclusive na culinária com o uso de massas e o consumo de verduras e legumes, produtos de suas hortas caseiras. Eles também contribuíram para o desenvolvimento do comércio regional e estiveram presentes na implantação das primeiras fábricas paraenses de calçados, como a Boa Fama. Também tiveram grande importância no beneficiamento e exportação de sementes oleaginosas.
Destino: Amazônia
Os países europeus vivenciaram ao longo do século XIX diferentes processos de transição demográfica. Além disso, as mudanças pelas quais passava o capitalismo, gerando um excedente demográfico que a economia não tinha capacidade de absorver, trouxeram como resultado uma acentuação nas imigrações européias a partir da segunda metade do século XIX. Desse modo, a origem da emigração italiana no Brasil tem sido associada aos graves problemas econômicos ocorridos na Itália desde o início de seu processo de unificação em 1861 e que se agravaram no decorrer do século XIX, quando as dificuldades vivenciadas pelos pequenos agricultores se somaram às dificuldades da enorme mão de obra disponível nas cidades que a industrialização da região setentrional não conseguia empregar.
Os países europeus vivenciaram ao longo do século XIX diferentes processos de transição demográfica. Além disso, as mudanças pelas quais passava o capitalismo, gerando um excedente demográfico que a economia não tinha capacidade de absorver, trouxeram como resultado uma acentuação nas imigrações européias a partir da segunda metade do século XIX. Desse modo, a origem da emigração italiana no Brasil tem sido associada aos graves problemas econômicos ocorridos na Itália desde o início de seu processo de unificação em 1861 e que se agravaram no decorrer do século XIX, quando as dificuldades vivenciadas pelos pequenos agricultores se somaram às dificuldades da enorme mão de obra disponível nas cidades que a industrialização da região setentrional não conseguia empregar.
No mesmo período, o Brasil apareceu no panorama internacional como um dos principais países receptores da grande imigração européia. Essa política visava não só a ocupação do território através dos núcleos de colonização, como também a miscigenação da população segundo o padrão racial europeu, além de resolver seus problemas de carência de mão de obra motivada pela expansão da cafeicultura no oeste paulista.
Pensar na presença italiana na Amazônia no fim do século XIX até as primeiras décadas do século XX, significa situar este segmento no conjunto das correntes migratórias que para a região se dirigiram, tendo como principal motivação a busca pelas riquezas decorrentes da exploração da borracha. Em Belém, os italianos procuravam morar em ruas do centro comercial. A motivação principal seria a proximidade do local de trabalho, ou ainda, por que a casa tinha geralmente a dupla função de comércio e residência. Os que chegavam depois preferiam também essa localização por que podiam contar com uma rede de apoio nos primeiros anos de imigração.
Publicações
A tese conta com interessante iconografia: fotografias de famílias, comércios, cartas, contratos, passaportes, documentos de associações, de hospedaria de imigrantes, bilhetes de passagem e outros. Todo esse material somado às contínuas pesquisas da Profa. Emmi estarão à disposição no banco de dados que será construído. Além disso, a pesquisadora publicará, ainda este ano, o livro "Italianos na Amazônia: pioneirismo e identidade". (Dandara Almeida)
A tese conta com interessante iconografia: fotografias de famílias, comércios, cartas, contratos, passaportes, documentos de associações, de hospedaria de imigrantes, bilhetes de passagem e outros. Todo esse material somado às contínuas pesquisas da Profa. Emmi estarão à disposição no banco de dados que será construído. Além disso, a pesquisadora publicará, ainda este ano, o livro "Italianos na Amazônia: pioneirismo e identidade". (Dandara Almeida)
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