Familiares de vítimas da ditadura militar que governou o Brasil entre 1964 e 1985 pretendem levar aos tribunais de Itália e Espanha denúncias sobre as desaparições e mortes de seus parentes. Em entrevista à ANSA, a historiadora Janaína Teles, membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, explicou que a decisão se deve à "morosidade" da Justiça brasileira na investigação dos casos. "Decidimos entrar em contato com o promotor italiano Giancarlo Capaldo e o juiz espanhol Baltasar Garzón", para que investiguem os crimes cometidos durante o Plano Condor e também antes que este sistema fosse instaurado pelas ditaduras sul-americanas, em 1975, explicou ela, que tem familiares que foram presos e perseguidos políticos. O Plano Condor foi uma estratégia conjunta elaborada pelas ditaduras da região -- Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai, além do Brasil -- para coordenar a repressão contra opositores. A pesquisadora explicou que, depois de conhecer o trabalho realizado por Capaldo para investigar mortes e desaparições de cidadãos italianos na América do Sul, durante a vigência do Plano Condor, os familiares de vítimas brasileiras decidiram procurá-lo. A ele, serão apresentados os casos de Líbero Castiglia e Antonio Benetazzo, dois italianos assassinados durante o regime militar brasileiro. Capaldo visitou o Brasil em janeiro deste ano, quando participou de um encontro de juristas que atuam em causas ligadas a violações dos direitos humanos, ocorrido no Fórum Social Mundial, no Pará. Em dezembro de 2007, com base no trabalho realizado pelo promotor, a juíza italiana Luissana Figliola abriu um processo contra 13 militares brasileiros acusados de envolvimento com as desaparições dos ítalo-argentinos Horacio Campiglia e Ismael Viñas. Ambos foram vítimas do Plano Condor. Já a desaparição de Líbero Castiglia e a morte de Antonio Benetazzo, por outro lado, ocorreram em 1973 e 1972, respectivamente -- antes, portanto, que tivesse início a repressão coordenada pelos militares sul-americanos. Neste sentido, Teles destaca que o Brasil foi pioneiro nas desaparições de pessoas consideradas subversivas pelo regime. "Está documentado e há relatos de militares que provam que esta metodologia foi usada aqui antes que no Chile e na Argentina", explicou. Neste dois países, é grande o número de pessoas cujo paradeiro é desconhecido até hoje. A historiadora informou que deve visitar em breve a Espanha, onde tentará um encontro com o juiz Baltasar Garzón, que em seu país ficou famoso por atuar em causas de desaparecidos durante o governo do ditador chileno Augusto Pinochet, entre 1973 e 1990. Em 1998, ele emitiu uma ordem de prisão internacional contra Pinochet, que permaneceu alguns meses detidos na Grã-Bretanha e foi acusado de genocídio e torturas. O general chileno faleceu em dezembro de 2006. Com a exposição do contexto brasileiro na Europa e ação levada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) à Corte Interamericana de Direitos Humanos para cobrar do país a investigação do desaparecimento de 70 pessoas que integraram a Guerrilha do Araguaia, na década de 1970, a historiadora acredita que a opinião pública mundial poderá ter uma visão mais clara da repressão ocorrida no país. Para Teles, é necessário somar todos os esforços na justiça internacional, tanto na CIDH -- órgão que faz parte da Organização dos Estados Americanos (OEA) --, como nos tribunais da Itália e da Espanha.
Ansa
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