Em meio às incertezas que envolvem a renúncia e a sucessão do Papa
Bento XVI, a Itália, país que abriga o Vaticano, vai às urnas no próximo
domingo (24) e segunda-feira (25) para escolher seus deputados e
senadores, que irão formar o próximo Parlamento Italiano e apontar o
novo primeiro-ministro do país. Algumas centenas de milhares de
brasileiros e italianos no Brasil têm um papel importante na eleição – eles podem votar e escolher senadores e deputados que os representarão em Roma.
Diferentemente de outros países, os cidadãos italianos que vivem fora da Itália
não votam em candidatos representantes das regiões italianas – e sim em
pessoas que irão representar os expatriados no Parlamento do país
europeu. Desde 2006, os italianos no exterior têm direito a 12 deputados
e seis senadores no Parlamento.
Cada continente possui algumas vagas. Na América Latina, serão eleitos
quatro deputados e dois senadores, maior número depois do reservado para
a Europa. Os habilitados a votar já receberam suas cédulas em casa e
devem enviá-las de volta aos consulados, que receberão os votos até esta
quinta-feira (21).
Edoardo
Pollastri é candidato ao Senado italiano pela América Latina; ele já
ocupou o cargo entre 2006 e 2008 (Foto: Juliana Cardilli/G1)
Nesse contexto, há italianos que vivem no Brasil e até brasileiros que
são candidatos a representar a América Latina como parlamentares em
Roma. “É exatamente a mesma posição do deputado e senador eleito na
Itália. Temos os mesmos deveres, votamos em tudo, opinamos nos assuntos
italianos, no orçamento do país”, explica Edoardo Pollastri, que já
representou o Brasil como senador na Itália entre 2006 e 2008, e tenta
agora voltar ao Parlamento pela Unione Sudamericana Emigrati Italiani
(Usei). “Mas temos também que dar atenção aos problemas da comunidade
italiana no exterior e convencer os outros senadores a tomar medidas em
favor dos italianos que moram fora.”
Pollastri, de 80 anos, foi eleito em 2006 e fez um governo de apoio à
centro-esquerda italiana. Seu mandato deveria ter durado quatro anos,
mas houve a antecipação das eleições para 2008, e ele não conseguiu ser
reeleito. Agora mudou de estratégia – se aliou a Usei, uma lista cívica
de candidatos da América Latina, e espera votos não apenas dentro do
Brasil para conseguir se eleger.
O italiano veio para o Brasil em 1975, onde criou suas filhas e se
ligou à política. No período em que foi senador, se dividiu entre Roma e
São Paulo, o que pretende repetir caso seja eleito novamente.
Entre suas principais propostas, estão tentar minimizar a fila de
pretendentes à cidadania e aumentar o intercâmbio entre micro e pequenas
empresas italianas e brasileiras, além de promover um maior intercâmbio
entre os jovens brasileiros e italianos. “Em 2006 fiz parte de uma
comissão que conseguiu contratar 150 pessoas a mais nos consulados de
todo o mundo para acelerar o processo de cidadania. A solução seria uma
grande força-tarefa para resolver em um ano e limpar essas pendências”,
explica.
No campo dos negócios, ele espera usar novamente sua experiência como
presidente da Câmara de Comércio Itália-Brasil e ex-presidente da
empresa de alimentos Visconti.
Outro parlamentar que tenta estender seu mandato é Fabio Porta, de 49
anos, atualmente dono de uma das vagas de deputado reservada à América
Latina e em busca da reeleição pelo Partito Democratico. Porta começou a
ter contato com o Brasil aos 30 anos e se mudou para São Paulo em 1998,
onde desenvolveu cooperações socioeconômicas entre Brasil e Itália.
Desde 2008, é um dos deputados da América Latina na Itália.
“É uma experiência extraordinária em termo de contato com a maior
comunidade italiana fora da Itália e de grande trabalho no plenário e na
Comissão Assuntos Exteriores com os meus colegas”, explica. Entretanto,
como opositor do ex-premiê Silvio Berlusconi,
Porta também teve experiências negativas, por “não ter encontrado, na
maioria do Parlamento e na interlocução com o Governo, o interesse e
disponibilidade necessários para a solução dos grandes problemas da
nossa comunidade – por exemplo, acabar com ‘fila da cidadania’ nos
consulados.”
Fabio Porta é deputado representando a América
Latina na Itália e tenta a reeleição (Foto: Divulgação)
Latina na Itália e tenta a reeleição (Foto: Divulgação)
Como propostas, Porta que instituir um fundo para refinanciar a
força-tarefa para solucionar os problemas nos consulados – questão
também abordada por Pollastri -, além de melhorar o atendimento
consular, aumentar o intercâmbio entre as universidades e microempresas e
instituir nas escolas italianas o ensino sobre a presença italiana no
mundo, entre outros.
Recepção dos colegas
A inclusão de 18 parlamentares representando os italianos no exterior não foi recebida de braços abertos por todos em Roma. “As recepções foram diferentes dependendo dos eleitos. Quem não fala bem italiano não é bem recebido no Parlamento. Houve certa resistência no início, mas eu fui muito bem recebido, já tinha uma certa experiência política”, afirma Pollastri, candidato ao Senado.
A inclusão de 18 parlamentares representando os italianos no exterior não foi recebida de braços abertos por todos em Roma. “As recepções foram diferentes dependendo dos eleitos. Quem não fala bem italiano não é bem recebido no Parlamento. Houve certa resistência no início, mas eu fui muito bem recebido, já tinha uma certa experiência política”, afirma Pollastri, candidato ao Senado.
Para o deputado Fabio Porta, os representantes do exterior estão
conquistando aos poucos a confiança e o respeito dos colegas. “Não foi
fácil [para eles] aceitar 18 parlamentares que pegaram o lugar de outros
tantos eleitos em Itália”, explica.
Os dois “brasileiros” que já ocuparam cargos no Parlamento também
criticam os candidatos do exterior que não falam italiano fluentemente e
não veem o cargo com seriedade. “Hoje posso dizer que me sinto
respeitado e valorizado plenamente. Infelizmente, em todos os eleitos
no exterior, especialmente pela América do Sul, desenvolveram um
trabalho adequado ao nosso mandato. Isto, de forma indireta, influenciou
negativamente o papel de todos os eleitos no exterior”, afirma Porta.
O cônsul da Itália no Rio de Janeiro, Mario Panaro, ressalta a
importância que esses representantes podem ter, apesar de seu número
pequeno em relação ao Parlamento – são 630 deputados e 315 senadores no
total. “É um percentual reduzido, fica abaixo de 5%, mas esse limite é
compensado pela representatividade. Eles representam um território muito
grande, onde a Itália tem interesse. Podem expressar pedidos e
propostas que são úteis não apenas para as comunidades que eles
representam, mas para os interesses da Itália no mundo e nos outros
países.”
Os italianos que vivem no Brasil e os brasileiros com cidadania italiana que tenham mais de 18 anos podem votar – quem tem entre 18 e 24 anos vota apenas para deputado; a partir dos 25, também é possível escolher os senadores. Os eleitores que moram no Brasil podem escolher dois deputados e um senador.
O voto é feito pelo correio. Todos aqueles que estavam em dia com seus cadastros nos consulados italianos e informaram que residem no exterior receberam as cédulas de votação em casa, acompanhadas de um envelope já com selo para que elas sejam enviadas à representação consular. O prazo limite para o recebimento das cédulas por parte do consulado é até esta quinta-feira (21) às 16h. Por isso, quem ainda não enviou seu voto deve se apressar.
Segundo o cônsul da Itália no Rio, cerca de 250 mil pessoas estão habilitadas a votar nas eleições italianas no Brasil. Entretanto, a participação não tende a ser alta. “Em 2008, apenas 51% dos habilitados votaram no Brasil. Na Itália esse índice chegou a 69%”, explica Panaro.
As vagas sul-americanas são normalmente dominadas por argentinos – a Argentina tem uma colônia italiana maior que a brasileira e também maior taxa de participação na eleição. Até hoje, apenas Pollastri e Porta foram eleitos como representantes do Brasil. Atualmente, os dois senadores a América do Sul são argentinos. Além disso, apenas um venezuelano já foi deputado.
O cônsul ressalta a importância do envio dos votos. “Um número expressivo de eleitores que participam significa um maior interesse na política italiana, uma maior referência quando o parlamento se reúne e leva em conta as propostas de lei que serão feitas por cada deputado, cada senador. Se tem uma participação menor no voto, significa um interesse menor, isso pesa na consideração de cada continente”, afirmou.
O deputado Porta destaca o dever civil daqueles que obtiveram a cidadania. “Da mesma forma que lutamos para ver reconhecida a nossa cidadania temos que lutar para exercer com seriedade o direito-dever de ser parte de uma comunidade mais ampla. É a única maneira de garantir a permanência da nossa representação junto ao Parlamento italiano.“
O atual contexto econômico na Itália e no Mundo também deve ser um incentivo ao voto. “Estamos perante grandes desafios na Itália. Nós passamos por um período que foi sobretudo de dificuldades econômicas e sociais, mas que também marcou um engajamento maior para ultrapassar os obstáculos. Fomos obrigados a reformar o país, com um cronograma muito mais apertado que pensamos antes. O próximo governo será obrigado a continuar nesse caminho, para poder assegurar condições econômicas e de crescimento compatíveis com as exigências dos jovens, da população”, afirmou Panaro.
Ex-premiê Silvio Berlusconi tampa os olhos durante evento em Roma
(Foto: REUTERS/Max Rossi)
Assim como em 2008, estas eleições também foram adiantadas - depois que Mario Monti, o atual premiê, anunciou sua renúncia. Ele, que é senador vitalício, lidera uma coalização centrista. O centro-esquerdista Pier Luigi Bersnani lidera as pesquisas, e o ex-premiê Silvio Berlusconi, que ocupou o cargo por quatro vezes, faz parte de uma coalizão de centro-direita.
A renúncia do Papa, anunciada na semana passada e marcada para o dia 28 de fevereiro, deve influenciar os resultados, segundo analistas. Além de diminuir a presença dos candidatos na mídia – tomada por reportagens sobre o Vaticano, há possível associação a ser feita por eleitores entre a decisão do papa de renunciar por causa da sua idade avançada e a recusa de Berlusconi em fazer o mesmo, apesar de ele ter 76 anos e já ter sido premiê em quatro ocasiões.
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