Buenos Aires, Ansa - O pintor Raúl Lozza, descendente de imigrantes italianos, morto há dois anos aos 96 anos de idade em Buenos Aires, foi um dos artistas mais premiados da Argentina. Em vida, ele acumulou todos os prêmios de maior destaque, como o de Críticos da Arte, do Museu Nacional de Belas Artes, do Konex, e duas dúzias mais.
A maioria dos argentinos desconhece a herança artística de Raúl Lozza, cujas obras enriquecem museus do mundo e coleções particulares.
Uma biografia recente, apresentada na Feira do Livro de Buenos Aires e intitulada "Como Raúl Lozza navegou rio acima e descobriu a arte concreta", resgata sua contribuição renovadora à arte argentina.
Lozza foi um dos grandes protagonistas da maior rebelião e transgressão já vista nas artes plásticas, que culminou com a fundação da Associação de Arte Concreta-Invention, em 1945.
Os membros dessa Associação (Raúl Lozza, Tomás Maldonado, Alfredo Hlito, Edgar Bayley, Lidi Praty, Enio Iommi, entre outros), romperam com os conceitos da representação e da abstração ilusionista. Naquela época, no fim da Segunda Guerra Mundial, Buenos Aires se tornou o epicentro mundial da ruptura com as tradições da pintura acadêmica.
A biografia de Raúl Lozza, escrita pelo seu filho Arturo, jornalista e ensaísta, começa em Pávia (Itália), terra de origem dos avós do artista, até sua morte em uma casa em Buenos Aires, em janeiro de 2008.
Arturo Lozza percorreu a rota de seus antepassados e seguiu os passos de seus avós desde a Pávia lombarda, na planície do Pó, nos locais onde "os errantes clérigos goliardos da Idade Média cantavam poemas sacrílegos, contrários aos ensinamentos da Igreja e aos costumes tradicionais".
Arturo relembrou à ANSA: "Meus bisavós, Francesco e Giusseppa Salvareschi, vieram de Pávia em 1886 e se instalaram em Alberti, na província de Buenos Aires. Apesar de analfabetos, seus descendentes foram pioneiros na Argentina. Meu avô, Rafael Lozza, construiu em 1920 o primeiro teatro lírico de Alberti , em plenos pampas argentinos, à semelhança do La Scala de Milão. Este teatro ainda existe".
A sua tia Amalia Righetti, italiana, educou Raúl Lozza e o ensinou a pintar. "Aquele descendente dos primeiros Lozza vindos de Pávia foi um dos artistas plásticos mais valorizados na Argentina", disse ele.
Nessa busca pelas suas raízes, Arturo encontrou Belbello de Pávia, miniaturista do século XV; Gianfrancesco Bembo, que colaborou com os afrescos de Cremona; Ambrogio da Fossano, que decorou a Certosa (mosteiro local) e renovou a arte dos lombardos; e Michelangelo Merisi, mais conhecido como Caravaggio, porque nasceu nesse povoado da Lombardia.
Como as histórias dos artistas não são lineares, este livro conta como Lozza de fato foi contra a corrente, como teve que suportar o peso de uma vida recheada por grandes tragédias, como liderou a luta contra a censura nos tempos do regime militar, como seus colegas artistas o elegeram secretário-geral e presidente da Associação Argentina dos Artistas Plásticos e como ele viveu a separação de sua esposa Matilde.
O livro tem um profundo conteúdo didático porque, além das cerca de 50 ilustrações, incorpora em seus textos as manifestações artísticas do período, as teses de cada um dos protagonistas e as rebeliões de poetas, músicos e artistas nos tempos da turbulência social dos anos 40, com a irrupção do peronismo.
Raúl Lozza deixou uma grande obra. Sua teoria estrutural da cor tem sete volumes, mais de três mil páginas. A obra foi escrita entre 1947 e 1949 e o difícil trabalho de edição está a cargo de seus dois filhos, Carlos e Arturo Lozza.
O último prêmio que recebeu foi em fins de 2007, concedido pelo Ministério de Cultura da Nação. Quando lhe foi entregue, o artista pronunciou suas últimas palavras em público e foi muito aplaudido pela platéia: "Se não posso ensinar, como aprendo?", questionou.
Semanas mais tarde, em 27 de janeiro de 2008, morreu em sua casa no bairro de La Paternal, um dos poucos da capital argentina que ainda mantém sua aparência, com casas baixas, cafés e clubes de bairro.
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