sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Usuários do Facebook enaltecem máfia italiana no site

Autoridades italianas investigam discussões em comunidades on-line. Por outro lado, campanha solicita remoção desse tipo de conteúdo.

Seu colega da faculdade está no Facebook. Assim como seus primos e amigos. Mas sabe quem mais encontrou no Facebook uma ótima forma de manter contato? Algumas pessoas da Sicília que sabem muito sobre networking. Há algumas semanas, autoridades italianas começaram a investigar discussões em grupos do Facebook dedicados a mafiosos condenados, preocupados com a possibilidade de alguns desses membros serem mais do que simples fãs. Ao mesmo tempo, uma campanha que solicita ao Facebook a remoção de paginas a favor da máfia tem ganhado força, enquanto milhares de membros do site de relacionamentos se juntam a grupos antimáfia.

Diversos grupos solicitam remoção de conteúdo a favor da máfia. (Foto: Reprodução )

O debate saltou da sociedade civil para a sociedade on-line após recentes notícias revelarem que mais de 2 mil pessoas se juntaram a grupos de interesse no Facebook saudando Salvatore Riina, o famoso chefão dos chefões, conhecido como "Toto", preso em 1993 depois de mais de duas décadas foragido. Também há homenagens a seu sucessor, Bernardo Provenzano, preso em 2006 após quatro décadas escondido. Ambos estão condenados à prisão perpétua.

o nazismo", disse Rita Borsellino, cujo irmão, o magistrado Paolo Borsellino, passou a vida investigando a Cosa Nostra antes de ser morto, em 1992, por um carro-bomba. Riina foi condenado mais tarde por tê-lo encomendado. Borsellino acredita que o Facebook foi "prejudicado" por páginas que glorificam a máfia. "Essas são pessoas acusadas de crimes graves e estão na prisão", acrescentou

Comunidades
Os grupos do Facebook, gerados pelos próprios usuários, motivam a livre troca de comentários sobre um tema específico. Depois de receber a atenção da imprensa, alguns grupos desapareceram, incluindo um denominado "Toto Riina, o Verdadeiro Chefão dos Chefões", cujos membros desejavam um feliz Natal ao mafioso e expressavam sua disponibilidade de trabalhar para ele. Outro grupo solicitava a "beatificação imediata" de Provenzano. O Facebook afirmou ter retirado algum conteúdo relacionado à máfia por violação às condições de uso do site. Sob essas regras, os membros concordam em não usar o Facebook "de nenhuma forma ilegal", nem disponibilizar conteúdo considerado pela empresa como "prejudicial, ameaçador, ilegal, difamatório, transgressor, abusivo, incitante, perturbador, vulgar, obsceno, fraudulento, invasivo em relação à privacidade e aos direitos de divulgação, abominável, ou repulsivo em relação a raça, etnia ou qualquer outro aspecto". Outros grupos são fechados ao público em geral, incluindo "Fãs de Toto Riina, Um Homem Incompreendido", que se autodeclara "contra os falsos moralistas". Nenhum mafioso convicto tem sua própria página no Facebook, apesar de ser tentador imaginar a atualização do status deles: "Toto Riina está tentando comprar um juiz". "Bernardo Provenzano gostaria de não ter que cumprir tantos anos de pena".

Autoridades
Sob ordens de magistrados antimáfia de Palermo, autoridades italianas contataram o Facebook, que confirmou estar trabalhando com os oficiais italianas que abriram a investigação. "Estamos levando isso a sério, sem exagerar em sua proporção", afirmou Maurizio De Lucia, magistrado da promotoria pública antimáfia em Palermo. De Lucia contou que os promotores estão tentando determinar a possibilidade dos membros dos grupos on-line pró-máfia serem, em sua maioria, "garotos querendo se divertir" ou gângsteres buscando novas formas de enviar mensagens codificadas uns aos outros. Até o momento, as autoridades disseram não ter encontrado evidência de nenhuma atividade criminal no site. Autoridades disseram não ter encontrado evidência de nenhuma atividade criminal ligada à máfia no site de relacionamentos Facebook. Na semana passada, um membro da comissão antimáfia do parlamento italiano, o senador Gianpiero D'Alia, solicitou uma investigação governamental e apressou seus colegas a removerem suas páginas no Facebook até que essa rede social on-line elimine os grupos pró-máfia. "Não podemos aceitar na realidade virtual algo que não aceitamos na vida real", disse D'Alia, em entrevista por telefone. A atitude foi largamente simbólica. Sem sombra de dúvida, a dimensão da lei italiana não alcança os servidores do Facebook, localizados em Palo Alto, Califórnia, e o ato de elogiar a máfia é protegido pela leis que defendem a liberdade de discurso em ambos os países. Um porta-voz do Facebook, que se recusou a ser identificado para este artigo sobre a máfia, afirmou que a empresa "poderá ser solicitada a revelar informações de usuários em obediência a exigências legais, como intimações ou ordens judiciais, ou em conformidade às leis aplicáveis". Porém, ele acrescentou que a empresa não revelará nenhuma informação "até acreditarmos completamente que a solicitação de informações pela execução da lei ou de litigantes privados obedece a padrões legais aplicáveis".

Consenso
As autoridades italianas afirmaram que uma de suas maiores preocupações – além de a rede virtual facilitar o crime – é de como a máfia poderia usar sites como o Facebook para criar consenso tácito entre cidadãos que agem de acordo com a lei. "Isso é mais preocupante", disse o coronel Iacopo Mannucci, da polícia de Palermo, que, no mês passado, prendeu quase cem pessoas acusadas de tentar reconstituir o conselho de liderança da máfia pela primeira vez, desde a prisão de Riina, em 1993.

Muitos afirmam que o Facebook, com 150 milhões de membros por todo o mundo, é uma ferramenta saudável para alimentar o debate público. Realmente, outras pessoas usam o Facebook para mobilizar uma resistência contra a máfia. Um grupo italiano chamado "Máfia Fora do Facebook" tem 166 mil membros e organizou um "blackout" de um dia no Facebook, quando os membros não acessaram o site para protestar contra a presença dos grupos a favor da máfia. Outra comunidade, cuja tradução do título é "Sim Para os Seios, Não Para Toto Riina", questiona por que o Facebook recentemente considerou ofensivas e removeu fotos de mães amamentando, mas permitiu páginas enaltecendo os mafiosos. Mais de 23 mil pessoas se juntaram ao grupo "Em Homenagem a Giovanni Falcone, Paolo Borsellino e Sua Escolta Policial", uma homenagem a Borsellino e Falcone, outro conhecido juiz que lutou contra a máfia e foi assassinado em um ataque de bomba, em 1992. Em outra página, um membro citou Falcone: "Homens morrem, mas suas ideias persistem. Seus esforços morais permanecem, e eles continuam a caminhar com as pernas de outros homens". E em suas páginas no Facebook.
Do New York Times

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