quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Receita de Ano Novo





Receita de Ano Novo

Carlos Drummond de Andrade

 
Para você ganhar belíssimo Ano Novo


cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,


Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido


(mal vivido ou talvez sem sentido)


para você ganhar um ano


não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,


mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,


novo


até no coração das coisas menos percebidas


(a começar pelo seu interior)


novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,


mas com ele se come, se passeia,


se ama, se compreende, se trabalha,


você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,


não precisa expedir nem receber mensagens


(planta recebe mensagens?


passa telegramas?).


Não precisa fazer lista de boas intenções


para arquivá-las na gaveta.


Não precisa chorar de arrependido


pelas besteiras consumadas


nem parvamente acreditar


que por decreto da esperança


a partir de janeiro as coisas mudem


e seja tudo claridade, recompensa,


justiça entre os homens e as nações,


liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,


direitos respeitados, começando


pelo direito augusto de viver.


Para ganhar um ano-novo


que mereça este nome,


você, meu caro, tem de merecê-lo,


tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,


mas tente, experimente, consciente.


É dentro de você que o Ano Novo


cochila e espera desde sempre.


Texto extraído do "Jornal do Brasil", dezembro/1997

Redação Ale'Italia


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